Boletim Semanal

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

O instante decisivo












HENRI CARTIER-BRESSON


Como sou apaixonada, e também por exercer o fotojornalismo resolvi reproduzir este artigo publicado hoje pela Agência Carta Maior.


Em agosto de 2008, completam-se quatro anos da morte de Henri Cartier-Bresson. O fotógrafo francês que rodou o mundo com sua Leica para registrar da intimidade de Picasso às últimas horas de Gandhi foi um dos maiores fotojornalistas do século XX, mesmo sem nunca ter aceitado o título. A obra de Bresson é um caleidoscópio de imagens comprometidas com os ideais do fotógrafo que reconstitui, em um álbum, a história recente.


Por Clarissa Pont

“Podemos fazer uma imagem na imprensa dizer qualquer coisa. Mostrei minha foto do Papa à minha mãe, que era uma mulher religiosa que lia os pré-socráticos, Demócrito, Heráclito, Espinoza. Ela disse que era minha foto mais religiosa. Um amigo me declarou, pelo contrário, que era a mais anti-religiosa possível”.Com essa história, Bresson explicou por muitas vezes porque sempre resistiu ao uso do termo fotojornalismo para designar seu trabalho fotográfico. Para ele, as fotos não eram feitas a fim de que uma história fosse contada, mesmo que a possibilidade de fazer suas fotos dependesse do investimento daqueles que queriam contar histórias com suas imagens (Bresson publicou grande parte de seu trabalho em revistas como Life e Paris Match).

Ele se considerava quase um antropólogo, cada reportagem demandava longos períodos em campo, convivendo com os grupos humanos e as características da nova cultura que conhecia. As fotografias eram seu diário. Ainda assim, é inegável que o trabalho dele seja o grande exercício de fotojornalismo do século passado. As primeiras fotografias são do final da década de 20, os registros fotográficos mais importantes, com a Leica, começam a partir de 1932.

Bresson abraçou a fotografia no momento em que o instantâneo fotográfico era inventado, sem poses estáticas, mas cenas congeladas do mundo em movimento. As fotografias realizadas com uma câmera de pequeno porte que permitiram e demarcaram um novo controle sobre a fotografia, aquilo que Bresson gostava de chamar de instante decisivo.“Colocadas perto umas das outras, as fotografias de Cartier-Bresson concedem um registro do século XX. Enquanto vemos o mundo através de seus olhos, ele se torna nosso também. Suas imagens são tão poderosas que se transformam em ícones. A cremação de Gandhi, Matisse vestindo um turbante, Giacometti com seu casaco sobre a cabeça enquanto atravessa a Rue d’Alésia na chuva, Faulkner e seu cachorro, Nova Iorque transfigurada ou a Rússia Soviética cochilando em sua letargia”, analisa o diretor da Biblioteca Nacional da França Jean-Noël Jeanneney.Bresson é parte de uma geração de fotógrafos que, a partir dos anos trinta, conquista relevância histórica.

No mesmo grupo, estão fotógrafos como Carl Mydans, Robert Capa, Margaret Bourke-White e André Kertész, Brassaï, Munkacsi, Robert Doisneau, David Douglas Duncan, George Rodger e David Seymour, só para citar alguns. É a primeira geração de fotógrafos que redefine as fronteiras entre os diferentes tipos de fotografia e destrói com a noção de que o fotojornalismo demanda apenas uma fotografia nítida. A partir deles, a forma também será conteúdo. Bresson nasceu em Chanteloup, nos arredores de Paris, em 22 de agosto de 1908. Na Europa, este início de século é marcado pela crescente utilização de imagens na imprensa. No mesmo ano, por exemplo, nasce o periódico inglês Daily Mirror, dos primeiros a ilustrarem suas páginas apenas com fotografias.

Em 1910, na França, o diário Excelsior começa a utilizar fotografias com regularidade e destaque. Em 1933, foi a revista francesa Vu a primeira a publicar uma reportagem de Bresson. A partir daí, o fotógrafo colaborou com a Life, a Paris Match, a Harpeer´s Bazar, a Picture Post, Realités e muitas outras das importantes revistas ilustradas do século XX.“Nos anos 30, trabalhei durante alguns meses para o diário comunista Ce Soir, de Louis Aragon. Foi lá que conheci Robert Capa e Chim Seymour, com os quais fundei a agência Magnum, depois da guerra. Éramos os fotógrafos credenciados do jornal. Aragon nos deixava totalmente à vontade. Vivíamos à margem da sociedade; o dinheiro de um era o dinheiro de outro”, relembra Bresson em entrevista a Michel Guerrin, publicada pela Folha de São Paulo em 2004.

A vida de Bresson se confunde com a História. Enquanto o facismo pairava sobre a Europa entre as duas Grandes Guerras, ele se alia à esquerda francesa e, embora não tenha sido filiado ao Partido Comunista, luta contra o facismo durante a década de 30.

A Segunda Guerra Mundial inicia e, em 1939, Bresson serve, através da Unidade de Filme e Foto, o Exército Francês. O fotógrafo é capturado em 1940 e mantido prisioneiro em um campo de trabalho forçado alemão até conseguir fugir em fevereiro de 1943. No retorno a Paris, passa a militar na Resistência Francesa, ajudando prisioneiros e fugitivos de guerra. Bresson costumava dizer que as experiências vividas durante a Segunda Guerra haviam sido crucias tanto no próprio trabalho quanto no surgimento da Agência Magnum. Após a Segunda Guerra, entre 1944 e 1945, Bresson realiza uma série de fotografias que terão grande destaque. São retratos de gente como Henri Matisse, Pablo Picasso, Arthur Miller, Jean Paul Sartre, Samuel Beckett e Truman Capote.

Cartier-Bresson ainda volta aos Estados Unidos em 1946. A viagem ocorre para que o fotógrafo participe de uma fatídica exposição póstuma. Seu trabalho seria apresentado no Museu de Arte Moderna de Nova Iorque, acrescido do detalhe de que os organizadores da exposição acreditavam que Bresson teria morrido durante a Segunda Guerra. Após a informação de que ele sobrevivera à guerra, a exposição foi transformada em uma retrospectiva de suas fotos no meio da carreira.
Hoje, um século após o nascimento de Bresson, revisitar seu trabalho é de uma importância histórica única. E em tempos em que fotojornalismo e publicidade vivem de perigosas relações, de importância política, idem.

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